Notas acerca do problema da organização para o partido revolucionário em nosso tempo
- Igor Dias
- 6 de jan.
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Atualizado: 30 de jan.
Igor Dias Domingues de Souza

"Barricada na esquina dos Boulevards Voltaire e Richard-Lenoir durante a Comuna de Paris de 1871." foto de Bruno Braquehais. 1871
É de muito que se vem discutindo no Movimento Comunista Internacional a espinhosa questão organizativa da vanguarda revolucionária. Ainda que sob as mais diversas perspectivas, sobre solos históricos dos mais variados, há um consenso acerca da importância dos métodos de organização na execução do trabalho político (ou metapolítico, se seguirmos Chasin em seu Futuro Ausente) que culmina na necessidade de um organismo capaz de dirigir as atividades da classe rumo à Revolução.
Devemos, porém, nos atentar à baixa cientificidade no que podemos chamar de estudos organizacionais partidários. O problema da forma organizativa, em especial, toma cores das mais variadas pela urgência de resposta contemporânea à utilização ótima dos recursos humanos disponíveis numa quadra histórica em que tanto a Revolução não entrou no horizonte e que a classe trabalhadora vem definhando como agente político por falta de perspectivas concretas de vitória. A resolução desta questão encontra, mesmo nos mais (autodeclarados) revolucionários dos partidos políticos, uma tentativa exaustiva de sintetizar em formulas pré-prontas um fazer partidário estéril, que se diz em construção, mas que, a bem da realidade, encontra-se estanque e que muitas vezes se vale do pastiche histórico como saída para problemas de natureza distinta daqueles encontrados por camaradas em outros cenários ou utiliza-se da tentativa e erro com base em pressupostos idealistas ou apriorísticos para definir sua forma organizativa. De qualquer modo, a primazia do real para as organizações revolucionárias parece ter se tornado, nesse aspecto, apenas mais uma palavra de ordem para propagandear seu séquito, pondo de lado a função do partido revolucionário para com a classe trabalhadora.
Isso não significa dizer, de forma alguma, que não se deva aprender com a experiência histórica dos tantos camaradas que caíram e daqueles que ainda seguem de pé em nossas fileiras. Muito menos é a afirmação de que não se deva lançar mão de novos meios, operações e estruturas de maneira experimental. No entanto, sem a clareza da concatenação de todos os elementos da organização, não se pode fazer com que ela funcione adequadamente ou mesmo que atue eficazmente na consecução de seus fins desejados. Para além disso, não se deve perder de vista que o fundamento estrutural de uma organização (independentemente de seu tipo) é responder a problemas de seu próprio tempo, posto que se encontra inserida em um tempo-espaço histórico particular. Dessa feita, temos que a forma organizativa correta para o partido revolucionário emana não das vontades formais idealizadas por terceiros, mas da realidade mesma e de suas necessidades e debilidades. O M-26-7 em Cuba não poderia ter e não teve a mesma forma organizativa que o ELN na Bolívia; o Partido Comunista Chinês não manteve a mesma organização durante a Grande Marcha e durante o período da Revolução Cultural; nem mesmo o aclamado Centralismo Democrático de Lenin se manteve estanque quando de sua vigência (compreendendo sua inexistência após o falecimento de Ilitch Ulianov), modificando-se constantemente em sua estrutura, hierarquia, presença ou ausência de liberdade de crítica, maior ou menor democracia interna, níveis de clandestinidade e abertura no recrutamento partidário; como demonstra Lessa em seu Notas sobre o Centralismo Democrático e a Organização que Hoje Necessitamos.
Rosa, em seu Greve de Massas, Partido e Sindicatos, ao observar a Revolução Russa de 1905 extrai a lição de que frente aos resultados da greve geral de janeiro –a colheita dos frutos políticos possíveis daquela disputa e repartição da greve unificada em greves menores cujas pautas econômicas imediatas dominavam – a classe trabalhadora inicia um árduo trabalho de organização à revelia das já estruturadas organizações sindicais existentes; um forte combate à burocracia estabelecida por modelos organizacionais apriorísticos, sendo, inclusive, mais adequados ao trabalho fundamentalmente revolucionário para o qual a classe se encontrava preparada no momento. Digo revolucionário no sentido de que desafia a ordem vigente como passo rumo ao socialismo, independente de possuir ele mesmo um caráter socialista. É mister compreender que o Partido compõe o movimento histórico de tomada do poder pelos trabalhadores como vanguarda, mas não como agente da revolução, precisamente por isso que seus métodos organizativos somente podem dar cabo de suas tarefas se estiverem de acordo com as tarefas concretos de sua quadra histórica, se estiverem apenas um passo à frente da classe, para que a teoria venha de fora, mas a consciência imane da própria prática revolucionaria do proletariado.
O tempo é mister em demonstrar que a utilização de fórmulas organizativas prévias resulta em um partido estanque, sem vida própria e sem perspectivas concretas, sendo substrato altamente nutritivo para cultivar oportunistas, burocratas e reformistas de todo o tipo – a exemplo do stalinismo e do eurocomunismo. Por outro lado, também comprova que o Partido Revolucionário independe da forma adotada para a luta, mas do seu alinhamento com as relações políticas e sociais imanentes do processo revolucionário em questão.
Que se compreenda, portanto, as lições da História o que tange à organização do Partido Revolucionário; aquele cuja existência não se encontra em siglas determinadas legalmente e que deve se conformar como a efetiva vanguarda revolucionária, a “parte mais avançada da classe”. O Partido em nossos tempos deve lidar seriamente com sua própria administração, analisar criticamente a história organizativa do Movimento Comunista Internacional, aprender com os erros e acertos tirando prova não por um “medidor de leninismo” e seus hífens ou de uma “balança de esquerda” quando a própria esquerda como projeto de emancipação humana feneceu, mas do próprio movimento do real no que tange a perspectiva do trabalho, da atividade partidária concreta em direção à revolução. O Partido Revolucionário deve ser, acima de tudo, uma organização de e para seu próprio tempo!
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